Reminiscências
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sexta, 22 de agosto de 2025

Reza a lenda que recordar é viver, pois na medida em que escrevemos a história de nossas vidas, imprimimos marcas e recebemos outras tantas que se fundem em nosso ser, de forma indelével. Ao passo que existem memórias que gostaríamos que nunca houvessem existido, outras tantas nos são prazerosas, como o cheiro de bolo que vem da cozinha e inunda a casa de sabor; a cantilena da chuva nas telhas ou o cheiro aconchegante de lençóis limpos. São memórias afetivas criadas por nós e pelos outros, e que se fundem como em um mosaico de reminiscências.

Recordações não tem data marcada para chegar, e muitas vezes são movidas por alguma data festiva ou acontecimento. Embora existam “gatilhos” em momentos de transição ou de perdas, que podem causar incertezas, dor ou gerar angustia. É nessas horas, onde a solidão se faz presente – mesmo que estejamos cercados de pessoas -, que as lembranças nos resgatam a força interior. Das coisas boas de recordar estão as pessoas queridas que nos marcaram suavemente, ou as que nos tatuaram de tal maneira que não precisamos vê-las para senti-las. Lembrar é sentir saudade do que já vivemos, de quem está distante e daqueles que não estão mais entre nós.

Deixamos marcas da nossa caminhada que não se apagam com nossa partida, e são revividas por quem sente saudade. Para além das fotos, restam muitas marcas no vazio que fica. Naquele espaço único que alguém ou que um pet ocupou em nossas vidas, e no próprio espaço habitado por eles. E isso me faz lembrar da música “Naquela Mesa”, do Sérgio Bittencourt, em homenagem ao seu pai Jacob do Bandolim: “Naquela mesa tá faltando ele, e a saudade dele tá doendo em mim.”

Dar conta de lembrar sem sofrer, é coisa que só o tempo se encarrega de fazer. Tudo no tempo das coisas. No tempo de cada um. Com apoio e acolhimento, com escuta ativa e afeto para quem precisa lidar com lembranças como a comida que ficou congelada, algo como o “feijão materno feito com zelo”, e que gostaríamos que não tivesse prazo de validade; as roupas deixadas na lavanderia; os resquícios de um prato sujo e da borra na xícara de café; ou as últimas mensagens que trocamos, e que insistentemente escutamos, na esperança de uma resposta. Nossos pets também deixam rastros, são os pelos que restam em nossas roupas; o silenciar de latidos e miados; a ausência de quem nos esperava sempre com festa e o vazio de quem se aninhava em nossos pés. Saudade muitas vezes é sorrir chorando, e sentir um aperto que não vem de um abraço que gostaríamos. Saudade é saber que sempre haverá dentro de nós, um pouco de cada um com quem convivemos.

 

Bons Ventos! Namastê.

 

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