O Olhar do Tempo
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sexta, 28 de novembro de 2025

O tempo nos transforma, nos adolesce e nos envelhece. As mudanças físicas são inevitáveis e por mais recursos que a medicina e a cosmetologia propiciem, ainda assim as marcas do tempo farão check-in em nosso corpo, como hóspede que vai ficando e quando se vê, não vai mais embora. E não vai mesmo! Sendo assim, a sabedoria seria desde cedo ter a propedêutica de como envelhecer sem se deixar amargurar pelo tempo, tendo como alento saber que apesar dos vincos e rugas, os olhos não envelhecem. Reconhecemos os outros e nos reconhecemos em fotos antigas pelos olhos, os mesmos que brilharam ao nascermos e que são imunes ao tempo. E se olhos são o espelho da alma como aludem os poetas, também são o contrato de muitos romances e observadores (por ironia) de nosso próprio envelhecer.

Mas, calma...! Não se assuste, tudo é tão gradativo que não dá nem para sentir o tempo passar, a não ser que o narcisismo seja fator preponderante em nossa identidade. Tendências ao hedonismo também dificultam a aceitação dos anos que se somam, tendo na vaidade o principal artífice desse modo de vida. Precisamos ver o belo em qualquer idade. Precisamos banir velhos ranços de pensar que a beleza só reside na jovialidade dos nossos vinte e poucos anos. Precisamos trabalhar mais o espírito, hoje tão pobre de sentimentos nobres e sujeito a efemeridades, pois “A beleza do corpo morre com o corpo. A beleza da alma é imortal!” (Hermógenes).

A busca desvairada por congelar os anos é bem retratada no polêmico romance de Oscar Wilde “O retrato de Dorian Gray”, onde crimes, suicídios e traições são cometidos em nome da vaidade extrema. O ponto central da obra é a corrupção moral por meio do esteticismo do personagem Dorian Gray, jovem, belo e aristocrata que tem sua beleza eternizada em um quadro pelo pintor Basil. Ao ver o quadro, Dorian fica triste apesar de reconhecer estar belamente retratado e diz: “Que tristeza! Eu irei ficar velho, feio e horrível. Mas, este retrato se conservará eternamente jovem. Nele, nunca serei mais idoso do que nesse dia. Se eu pudesse ser sempre moço e o quadro envelhecesse!... Por esse milagre eu daria tudo! Sim, não há no mundo o que eu não estivesse pronto a dar em troca. Daria até a alma!” E assim se desenrola a história, com a imagem do quadro envelhecendo e se transformando a cada falha moral de Dorian, e ele estranhamente se mantendo jovem. Uma crítica de Wilde ao hedonismo e narcisismo da sociedade vitoriana da época, mas cabível em tempos atuais, em uma obra cheia de ensinamentos como essa pérola: "A harmonia do corpo e da alma... Nós, na nossa cegueira, separamos estas duas coisas para inventar um realismo vulgar e uma idealidade vazia." (Wilde).

Saber envelhecer em uma sociedade que dita padrões não é tarefa fácil, pois nos cobramos e somos cobrados constantemente. Surtamos com um grama a mais, com um fio de cabelo branco a mais, sem falar em quem insiste em omitir a idade, e quando não, inventá-la. A diva Sophia Loren, que conseguiu conciliar corpo e espírito ensina: “As mulheres que vivem esperando o próximo creme milagroso não percebem que a beleza vem de uma felicidade secreta e de um equilíbrio interno.” Então, “Ter espírito é o segredo de toda a beleza. Pois, não há beleza que seja atraente sem que haja espírito.” (Christian Dior).

                                                                                                   Bons Ventos! Namastê.

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