Há um ano, entre o final de abril e o início de maio, o Estado do Rio Grande do Sul enfrentava a maior tragédia climática de sua história. As enchentes que assolaram o território gaúcho carregaram consigo os escombros do que um dia foi lar e evidenciaram a fragilidade da infraestrutura, a lentidão da resposta pública e a força de uma população que resiste. O rastro de destruição deixado ainda marca a vida de milhares de gaúchos, contabilizando não apenas prejuízos financeiros, mas também cicatrizes emocionais e sociais em famílias que ainda lutam para se reestruturar. Diante desse cenário caótico, confira, um ano depois, quais medidas preventivas foram tomadas e como está o processo de reconstrução dos locais mais atingidos e das vidas gaúchas.
Números que impactam e entristecem
A maior tragédia climática da história do estado gaúcho, que afetou 471 dos 479 municípios, o equivalente a 95% das cidades gaúchas, afligiu 2,3 milhões de pessoas e levou a óbito 183 cidadãos além de 27 pessoas que seguem desaparecidas mesmo passados um ano das enchentes. Cerca de 79 mil pessoas perderam suas casas levadas pela força da água, destas mais de 1.200 seguem desabrigadas e ainda procuram uma moradia para voltar a chamar de sua.
As chuvas também trouxeram recordes negativos para o RS. As precipitações torrenciais fizeram o Rio Guaíba, em Porto Alegre, atingir assombrosos 5,35 metros, superando e muito a cota de inundação de 3,6 metros, inundando parte da capital dos gaúchos. Outro município que apresentou números assustadores foi o de Lajeado, que viu o Rio Taquari chegar aos 33,35 metros, ultrapassando em mais de 50% a cota de inundação de apenas 20 metros e registrando uma verdadeira catástrofe ambiental e sanitária em todo o Vale do Taquari, principal ligação entre o interior do Estado e a Região Metropolitana.
Mostremos valor e constância
As destruições e devastações também abriram espaço para a reafirmação de espíritos que o povo gaúcho sempre soube cultivar e colocou a prova no seu momento de maior dificuldade, a generosidade e a solidariedade. No total, mais de R$ 117 milhões foram arrecadados em vaquinhas para as vítimas da tragédia. Mais de 3.375 milhões de itens gerais foram doados ao estado vindos de todos os cantos do Brasil e do mundo.
A atuação da população no resgate e salvamento de moradores ilhados em suas residências cercadas pela cheia dos rios também foi outro marco do espírito de solidariedade durante a catástrofe. A busca por vítimas da enchente levou os gaúchos a colocarem os seus barcos na água e totalizar mais de 82 mil moradores, além do prestar o socorro a 12.215 animais afetados pela calamidade.
Aos poucos, a água foi baixando e coube ao povo gaúcho ir às ruas e tentar, de alguma forma, apagar as marcas deixadas pela tragédia. Com isso, mais uma vez os cidadãos botaram a mão na massa para ajudar o próximo, removendo a lama e os resíduos deixados pela água para tentar tornar as localidades habitáveis da forma que deveriam ser.
- Começamos no dia 9 de maio, logo depois da enchente. Nós fomos em um grupo de 10 pessoas lá para Muçum. Ficamos cerca de 10 dias lá ajudando na limpeza das casas e socorro das vítimas. Depois, iniciamos no transporte de donativos. Levamos 12 caminhões de doação, sem ligação a nenhum órgão, tudo voluntariado mesmo. Levamos para o Vale dos Sinos, Vale do Taquari e Região Metropolitana – relata Fábio Kuwiatz, policial militar que atuou por 120 dias na ajuda humanitária.
Camila Giora, moradora de Roca Sales há 30 anos, relata que nunca tinha visto nada parecido. “Foi uma cena de terror, no primeiro momento pensávamos que não era verdade. Muita insegurança e pavor”, disse Camila. Segundo ela, a cidade está se reestruturando, mas ainda existem muitos resquícios da tragédia.
Givanildo Rodrigues, professor que reside há 14 anos em Arroio do Meio, teve a casa totalmente tomada pelas enchentes. Sua família foi resgatada de barco após três horas no telhado da residência e passou 75 dias abrigada longe de seu lar. Ele conta que, ao retornar, havia lama por todos os lados e os dias pareciam intermináveis. “Foram dias muito desanimadores para nós. Era muito barro, a gente trabalhava, trabalhava e parecia que não tinha feito nada. A coragem de pessoas totalmente desconhecidas foi o que possibilitou a chegada de ajuda que nos devolveu a vontade de viver”.
Medidas preventivas
Após a tragédia do último ano, uma série de medidas foram adotada pelo Estado com a finalidade de auxiliar na reestruturação das cidades afetadas e amenizar os danos em caso de novas cheias. Alguns exemplos são o Plano Rio Grande, que inclui obras em rodovias e pontes afetadas pelas enchentes de 2024, a elaboração de um plano de contingência para desastres socioambientais em parceria com a ONU e o Ministério Público, e um investimento de R$27,5 milhões ao longo de cinco anos para a aquisição de um novo sistema de radar meteorológico.
Confira abaixo alguns números de doações registrados pela Defesa Cívil em prol de ajudar os impactados pelas fortes chuvas:
• Água: 1.538.133 litros;
• Alimentos: 355,97 toneladas;
• Cobertores e roupas de cama: 115.670 itens;
• Colchões: 21.458 unidades;
• Fraldas: 40.183
• Materiais de higiene e limpeza: 138.515 itens;
• Materiais de higiene pessoal: 240.939 kits;
• Ração animal: 61.908 sacos;
• Roupas: 363.863 kits.